terça-feira, 8 de agosto de 2017

Retrato

A frustração promove rugas.
Rugas no rosto, rugas no coração, rugas na alma.
Olheiras se fixam e não há cosmético ou mandinga que amenize a aparência cansada de uma pessoa frustrada.
Sei porque tenho espelhos em casa.
O sorriso perde o sentido. Não há lógica em expressar uma alegria que não existe.
É um fruto amargo, feio e quase podre que a vida nos obriga a engolir como pagamento por espectativas que nunca deveriam ter sido criadas.
Um sonho da juventude que não foi realizado, oportunidades e prêmios que a vida trouxe e que foram perdidos ou desperdiçados, planos e projetos baseados apenas em fé... Relacionamentos irreais, surreais, desiguais. Juras e auto afirmações jogadas por terra. Batalhas inúmeras vencidas e no final, guerra perdida. Princípios sólidos pisoteados. Impotência diante das injustiças promovidas pela vida.
De repente o ser passa a sentir-se otário diante de sua própria vida.
Porquê lutei? Porquê sonhei? Para quê tanto trabalhei?
E ter que se apegar a migalhas de alegrias superficiais para não congelar a musculatura facial em molde de tristeza, sem esboço de emoção - já que tudo se tornou fútil, banal e sem graça, insípido, inodoro, incolor.
Força para continuar chega a parecer falta de coragem de parar. E saber que não precisaria mudar o passado para voltar a ter gosto pela vida. Pequenos ajustes, boa vontade e cumprimento de promessas. Sim, promessas. Essas agentes do mal que circulam a esperança o tempo todo alimentando-a e enfim, dão cabo dela ao se retirarem devagarinho, juntarem-se num grupinho lá no fundo do consciente e gargalharem enquanto a vêem se debater até quase morrer. Promessas não cumpridas são um punhal cravado pelas costas. Matam, mas bem lentamente. A frustração é o retrato da desilusão geral, começando por si mesmo, sem destino final.

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